Capítulo 01

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Naquele frio — que disseram, não viria — já estava sentado há dias.

Na verdade, não tinha certeza sobre o tempo ou a temperatura, afinal, as horas passavam mornas como os todos os outros anos a fio que estava ali, prostrado frente as telas que parecem iluminar com a luz azul, incapazes de aquecer feito o sol.

Enquanto escrevia, o pensamento se perdia nos conceitos dias lâmpadas incandescentes e as outras — já não se lembrava se se chamavam alógenas. Alógena, sempre lhe lembrava alucinógena. Como seria o mundo feito de luzes alucinógenas (…)

Assim, esquecia, sobre o que escrevia e sobre a temperatura, o tempo e o dia. Incapaz de se concentrar, novamente se perdia, na guerra fria entre sua imaginação e a rotina de dar aos outros o que mais lhe doía, os raros segundos de alegria.

Sobre o que mesmo escrevia? Talvez fosse melhor pensar nessa vontade tardia de escrever poesias, mas antes, precisava marcar um oculista — não se acostumava com oftalmologista –, tentar entender os benefícios da lente azul contra as mazelas dessa luz fria.

Luzes alucinógenas, energia e rebeldia.

O telefone vibra, esqueceu de enviar as alterações.

Na manhã gelada, tal qual geada, a ilusão atrasou seu dia.

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